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31.01.2011
31/05/2007O príncipe está nuSociólogo denuncia em livro a postura ambígua de FHCpublicado no jornal TRIBUNA DA IMPRENSA - 19/06/97por Fábio Fernandes Doutor em Sociologia pela USP em 1977 e autor de diversos livros, entre os quais “Collor: a cocaína dos pobres” e “Itamar, o predestinado”, o professor Gilberto Vasconcellos não tem uma postura analítica tradicional em sua disciplina. Em seu último livro, “O príncipe da moeda”, que será lançado amanhã, às 20h, no Museu da República, o alvo de Gilberto é o Presidente Fernando Henrique Cardoso. Alcunhado ironicamente de príncipe por Glauber Rocha, FHC tem sido acusado pela oposição de agir de forma inteiramente diferente de seus tempos de sociólogo opositor do Governo militar. “O príncipe da moeda” aponta na direção contrária: para Gilberto, não há diferença entre os discursos. Em entrevista ao Tribuna BIS, Gilberto fala um pouco sobre a trajetória de FHC e a participação da USP no processo. TRIBUNA BIS - Fale sobre o seu livro. GILBERTO VASCONCELLOS - “O príncipe da moeda” é uma reflexão sobre o clima intelectual e acadêmico de São Paulo que engendrou o pensamento de Fernando Henrique e sua prática política. É um livro sobre a história das idéias originárias desde 1920 em SP até agora. Uma análise da intelectualidade paulista e de como ela sempre se opôs ao nacionalismo, nacionalismo esse de Getúlio após a Revolução de 30, e que perdura até Jango passando pelo cinema de Glauber Rocha. O Senhor conheceu Glauber? Tive uns 10 encontros com Glauber. Conheci-o em 77, na “Folha de São Paulo”, onde eu era editorialista. Ele havia ido encontrar o Cláudio Abramo (um trotskista aristocrata, pessoa adorável), aí Cláudio me apresentou a ele e me disse: deixa isso aí (o trabalho), vamos bater um papo. E fui. Na página 42, você diz que FHC não chegou ao poder sozinho, mas sim que é a USP que se converteu em força material e se tornou apêndice da mídia. Há até mesmo um subsídio chamado “A conexão USP-PFL”. Ela tem uma importância tão grande assim? O PFL não surge na vida de FHC como raio em céu azul: não é aparição “ex-nihilo”, é um desdobramento desse pensamento colonizador que setores da USP assumiram. Daí essa aliança “sampabá” (FHC com ACM na missa presidida por Caetano Veloso). Falando em Caetano, há um tom de crítica nessa observação. A Tropicália foi e ainda é considerada um movimento cultural que trouxe progresso. Essa aliança não seria contraditória? A chegada de FHC ao poder é a chegada da Tropicália ao poder. A política do FHC é a estética do Caetano; não é à toa que no discurso de posse, FHC cita Caetano. Também há um alicerce estético. A USP foi completamente seduzida pela Tropicália, que é o discurso de “quem tem dinheiro tem razão, quem não for gostoso, belo e rico não tem razão”. Tem aparência de progressista porque junta o desenvolvimento desigual da sociedade brasileira, o palacete e a palafita.
Na página 38, você lembra que o escritor Barbosa Lima Sobrinho acusa FHC de ditador. O senhor também acha isso?É uma ditadura sem presos políticos e sem tortura... ainda. Mas é uma ditadura videofinanceira: uma simbiose num processo que aglutina Estado, mídia e mercado. Incluindo partidos políticos. E deixa o povo de fora? Completamente. O FHC tirou o carisma da política para colocar na moeda, negando a essência do passamento de Max Weber, que diz que não há dominação política sem base carismática; ele tirou isso da política e pôs na moeda, daí seu lado autoritário. A política deixa de ter autonomia e passa a ser um negócio. Quem não tem dinheiro não ganha eleição. como a esquerda vai se posicionar diante disso? Qual o verdadeiro adversário ideológico de FHC na sociedade brasileira? Essa é a questão que meu livro discute. Para FHC, seria um prato cheio ele ter o Lula como adversário em São Paulo, pois o PT e o PSDB têm uma mesma origem ideológica nesse Estado. Será que Lula seria o adversário de FHC ou apoiaria o antípoda de FHC. Quem é o antípoda de FHC hoje? Escrevi “O príncipe da moeda” para fornecer à oposição os argumentos e a estratégia para destruir o bloco que está no poder, o PSDB-PFL, passando pelo PMDB e pelo partidóide do Roberto Freire, o PSB.O senhor denuncia o fracasso do pensamento de esquerda ou o desmascaramento dos pseudo-intelectuais de esquerda?No livro lanço a formulação de que FHC sempre foi aquilo que ele é, não há um corte epistemológico entre o FHC jovem e o FHC velho. Se isso é verdade, por que ele, um proto-direita, seduziu toda a esquerda? Como obteve notoriedade de esquerdista, com um pensamento que nada tem de esquerda: ele resumiu o golpe a uma questão secundária, a do autoritarismo. Dizer isso e se opôr a isso não é ser de esquerda. Ele nunca toca na ferida, a sangria do lucro para fora do Brasil, a sangria imperialista. Difícil é explicar isso, que ainda tem que ser mais pesquisado. Entra em jogo não só o sistema intelectual universitário, como a sua ligação com os movimentos internacionais.
PRESIDENTE CARREGOU O TROPICALISMO AO PODER“O Príncipe da Moeda” analisa ambiente intelectual de SP, criador da visão política de FH.
publicado em O ESTADO DE SÃO PAULO - 13/07/97por Virgínio Moretzsohn Dizia Gilberto Amado: “Esse Glauber Rocha, por exemplo, é um arrebatamento a que só os santos - em sua candura - podem alçar. E de um talento tão faiscante e ígneo que só os demônios - em sua fogueira - podem polir”. A frase de Amado, escritor desmedidamente esquecido nos dias que rolam, tem razão: Glauber pedia para si tropas de anjos e outras de demônios e com elas criava mistura medida de prazer e conhecimento. Gilberto Feslisberto Vasconcellos agora nos oferta, pela editora Espaço e Tempo, O Príncipe da Moeda (264 páginas), trazendo nas orelhas os textos instigantes de Ricardo Oiticica e Paulo Becker, mais comportado. O primeiro toma do autor inglês idéias - a que chama da “santas indagações” - e por meio delas desenvolve seu raciocínio: “O golpe de 64 começou na Guerra do Paraguai” (Glauber Rocha); “Le PSDB c’est une m.” (Alain Touraine); e o próprio Gilberto Vasconcellos, ao enfatizar que “com Fernando Henrique, a tropicália chega ao poder; é o petróleo sem Petróleo”. Sem dúvida, o texto gilbertiano se passa exatamente em torno dessa visão tripartite, fazendo-o por meio de um estupendo domínio do instrumental linguístico, com metáforas que lembram Glauber Rocha. Um pouco demais a meu juízo. Não posso perceber as verdadeiras ligações entre Guerra do Paraguai e o golpe de 64, a não ser que muitos jovens brasileiros morreram em ambas. Claro a história é o que o historiador a faz, estribado em seu teatro de subjetividades. Fernando Henrique Cardoso, declaradamente o “príncipe da moeda”, não terá trazido apenas a tropicália ao poder. O Brasil, país de “desfeitos”, na linguagem oceânica de Darcy Ribeiro, vive, digamos, uma espécie de ucronia psicológica e intelectual, ao mesmo tempo atualizado e não. O que levou José de Alencar, em carta ao amigo Francisco Otaviano, no século passado, fazer a pergunta que as décadas seguintes não responderam: que país é este? Então, a tropicália não está no poder, mas no País. O PSDB, fundado em 1988 por dissidente do MDB, é bem mais do que disse o francês, ainda que eu não tenha visitado os intestinos partidários para verificar, in loco, que material cobre suas resistentes paredes. O livro é uma paroxística reflexão sobre o clima intelectual e acadêmico de São Paulo, o que formou o pensamento político de Fernando Henrique e sua prática política. Cuida das idéias originárias desde 1920 até agora, no combate ao nacionalismo getulista após 1930, e que vai até Jango e o cinema de Glauber. O que, todavia, me fascina é a construção frasal de Gilberto, suportando reflexões que nos levam longe. Por exemplo, escreve ele logo na página 13: “A concessão de monopólio televisivo, a sesmaria eletrônica legitimadora da ideologia do estado pós-64, produziu determinados efeitos que ultrapassam a esfera política. O que está em pauta é a totalidade cultural da nação”. Puríssima verdade. O Estado brasileiro vive, desde 1965, atracado à morfologia da mídia, principalmente da Rede Globo, com que troca, aqui e acolá, reciprocidades generosas, preenchendo, ambos, assim, as vértebras históricas brasileiras com essas “ternurinhas” de comadres. Gilberto acerta ainda mais. Para ele, vivemos sob os efeitos de um “capitalismo videofinanceiro”, termo usado “para designar a particularidade histórica do momento atual do Brasil, em que a presença monopolizada do sistema televisivo afeta sobremaneira a conduta do Estado, dos partidos políticos, da Igreja e da Universidade”. Como não? A perfusão midiática é a senhora dos narizes governamentais, invade bocas voracíssimas e enfia-se pelas vísceras grossas dos comandos republicanos, ali depositando os ovos de ouro. O Príncipe da Moeda exibe, no rastilho do roldão que deflagra, lições apetrechadas para o entendimento do Brasil de Fernando Henrique, segundo Gilberto um “Sociólogo inteiramente anti-romântico, no sentido de que foi o romantismo que inventou o verde-amarelo; de resto, nele a empatia pelos métodos das ciências sociais é infinitamente maior do que a afeição pelo processo civilizatório da gente brasileira”. De novo gramas de exagero. Contudo, o texto fica e se reproduzirá como raiz adventícia, levando para os leitores as sementes inequívocas do seu recado.
Matéria da revista Veja - A revista Veja de 13/08/97 chama a atenção para o livro O Príncipe da Moeda, do escritor Gilberto Vasconcelos, com detalhes inéditos sobre a vida de Fernando Henrique Cardoso e sua turma de sociólogos que assumiu o poder no Brasil em 1995. Segundo o escritor, "a sorte grande de FHC foi ter sido cassado pelo regime militar aos 37 anos - ficando livre para enriquecer e comprar fazendas com as ciências sociais". Sobre o Ceprab, centro de pesquisas fundado por FHC em 1968, na volta do exílio, quandp recebeu 180 mil dólares da Fundação Ford para financiá-lo, Giberto diz tratar-se "uma agência do imperialismo". Intelectual de mão cheia e professor da Universidade Federal de Juíz de Fora, autor de Brizula e Collor - Cocaína dos Pobres, além de uma dezena de obras políticas, "Giba sustenta" - diz a reportagem de Veja - "que não foi depois da posse no Planalto que Fernando Henrique começou a cumprir o mais célebre ponto de seu programa de governo - o fim da era Vargas". Para o professor, o Presidene já fazia isso no final dos anos 50 e começo dos 60, quando dava aula de sociologia na Universidade de São Paulo". "Isso aconteceu, segundo Giba," prossegue a revista, "porque FHC e seus colegas da USP construíram uma obra alimentada por idéias radicais e autores de esquerda, mas sem levar em conta um dado crucial - a questão nacional, a independência política e econômica do país. Graças a um desvio dessa grandeza, que permitiu cultivar uma visão política que acaba transformando Getúlio Vargas no inimigo principal do progresso do país neste século, os profesores esquerdistas da USP consumaram uma duradoura aliança com os salões liberais e as empresas multinacionais". "Foi assim, explica Giba, que FHC assumiu uma palavra nova - dependência -, numa semântica que abandonava a noção de imperialismo, dizendo que o capital estrangeiro vinha para ajudar, não para dominar. "Ele reconta décadas de vida intelectual num ambiente em que professores que escreviam sobre o caos final do capitalismo e a abertura da revolução operária freqüentavam a elite quatrocentona. Os figurões do poder, dos negócios e do prestígio, fizeram do anti-Getúlio sua linha geral de ação política por um longo período, que se iniciou em 9 de julho de 1932, data da Revolução Constitucionalista, e prolongou-se por décadas, com outros nomes e outros personagens , de certa maneira chegando até os dias atuais." "Desse caldo intelectual saíram teses que condenam as instituições deixadas por Getúlio, os sindicatos, a legislação trabalhista, um embrião de serviço público - tudo apresentado como cópia execrável do fascismo de Mussolini, ora como uma simples farsa de demagogos prontos para atrair os trabalhadores na ptimeira oportunidade, os populistas". "Eles apontavam tantos defeitos que você não entende por que o Vargas se suicidou nem por que ocorreu o golpe de 64", explica Gilberto Vasconcelos". "Aliás, para ele não houve golpe, houve o colapso do populismo", ironiza, citando o título de um dos best-sellers da época, O Colapso do Populismo no Brasil, de Octávio Ianni, irmão intelectual de FHC nos primeiros anos de academia". "Atrás de outras pegadas, Giba encontra Francisco Weffort, atual ministro da Cultura de FHC e fundador do PT. Aplicadíssimo crítico do populismo, Weffort (ele recebeu uma bolsa para estudar nos Estados Unidos, também pela Fundação Ford) fez trabalhos que inspiraram outros intelectuais e outros estudos, alimentando até grupos de esquerda que, após muitas voltas, se acabaram encontrando no PT. Giba argumenta que, irmanados no antigetulismo, tanto o PSDB como o PT se tornaram legenda incapazes de responder à questão nacional". A reportagem de Veja é preconceituosa e chama a obra de "delirante" e Giba "adjetivoso", mas admite que a obra é "um livro turbinado", "O livro", diz a revista, já recebeu resenhas elogiosas e até levou seu autor à televisão para dar entrevistas". Veja ainda diz que Gilberto Vasconcelos é "hiperbrizolista furioso , com quatro paixões políticas - Getúlio Vargas, Darcy Ribeiro e o cineasta , Glauber Rocha", mas tira o chapéu, quando afirma: "O livro O Príncipe da Moeda foi lançado na clandestinidade, mas é uma das surpresas do ano. "Não se imaginava essa repercussão", explica Paulo Becker, psicanalista que mantém a editora Espaço e Tempo "por militância cultural e higiene mental".